Diagnosticado com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) há 13 anos, o paranaense Valdemar Maistrovicz decidiu eternizar suas memórias de uma forma incomum e comovente: usando apenas o movimento dos olhos. A história de vida do ex-funcionário da Copel virou livro, publicado de forma independente. Com 148 páginas, Valdemar: olhares sobre minha história foi lançado no dia 16 de julho, data em que o autor completou 67 anos, durante um evento íntimo com amigos e familiares.
Impossibilitado de mover o corpo e de falar, Valdemar utiliza um dispositivo de tecnologia assistiva, o sistema Tobii, que interpreta os movimentos do globo ocular. Com esse equipamento, conseguiu redigir todo o conteúdo do livro, escrito ao longo dos últimos anos.
Nascido em Prudentópolis, o autor vive hoje em Curitiba, ao lado da esposa, Sônia, com quem é casado desde 1981. Pai de duas filhas, Camila e Gabriela, Valdemar precisa de cuidados 24 horas por dia, mas segue cultivando suas paixões, como torcer pelo Palmeiras, jogar xadrez online e acompanhar programas de televisão.
“Atualmente, sou acamado por estar com a doença ELA, que não possibilita movimentar nada no meu corpo, também não falo, escuto apenas com aparelho nos ouvidos e movimento somente a boca e os olhos”, conta Valdemar na obra. “Para se ter uma ideia, este livro escrevi com os olhos pelo sistema Tobii, graças a essa possibilidade, resolvi escrever um livro, contando sobre a minha vida desde os meus cinco até os meus 63 anos”, conta.
O material contém uma apresentação, na qual o autor explica os objetivos dos seus escritos, uma linha do tempo e pequenas histórias que descrevem momentos marcantes de sua trajetória e da família. Há ainda uma visão sobre os fatos do Brasil e do mundo, alguns diários de como é sua rotina atualmente, agradecimentos e depoimentos de familiares e de enfermeiras que fazem parte de seu dia a dia. No final, há uma seção com fotografias.
Para a filha mais velha do autor, Camila Maistrovicz, o livro é mais do que uma autobiografia: é uma forma de garantir presença e permanência em um mundo que a doença tentou limitar. “Como filha, acho que o livro foi uma forma de ele ser ouvido quando a voz faltou. O livro fica, é importante, é um documento impresso no mundo, real, físico, dá pra pegar”, afirma.
“Foi como ele conseguiu deixar a presença dele no mundo, já que a presença física ficou muito complexa por conta da doença”, conta. Camila destaca que o pai nunca se colocou como doente — nem mesmo no livro. “Isso é muito interessante. Ele nunca deixou a doença vir antes do Valdemar”, diz.
Apaixonado por registros desde sempre, Valdemar comprou uma filmadora JVC em 1992 e passou a gravar vídeos caseiros de momentos simples: almoços, brincadeiras e carinhos com as filhas. “Ele sempre gostou de registrar memórias. E, anos depois, a Gabi, minha irmã, acabou virando fotógrafa justamente de famílias, desses momentos pequenos e cheios de significado. Com incentivo dele e da minha mãe”, conta Camila. “Hoje ela é reconhecida na área, com 15 anos de carreira, e foi quem fez a foto da capa do livro”, complementa.
Vida plena e sem limites
Ao ser questionada sobre uma possível mensagem do pai às pessoas que vivem com ELA, Camila é direta: “Não acho que ele quis deixar mensagens específicas. Engraçado que, no livro, ele mesmo não se coloca como doente. Talvez essa seja exatamente a mensagem: viver plenamente a vida que se apresentou pra você. Ver a riqueza de momentos que passam batido. Esses são os verdadeiros tesouros”, explica.
Valdemar Maistrovicz nasceu em uma família de pequenos produtores rurais, em Prudentópolis, em 16 de julho de 1958. As dificuldades enfrentadas no contexto da época fizeram a família mudar de casa diversas vezes, até que se estabeleceu em Guarapuava. Valdemar se casou com Sônia, sua “eterna namorada”, em 1981, com quem teve duas filhas: Camila e Gabriela.
Foi funcionário público de carreira na Copel, a única empresa na qual teve sua carteira assinada. Foi copeliano de 1978 a 2012, quando se aposentou um ano antes do previsto por causa do diagnóstico de ELA. Atualmente, vive com a esposa em Curitiba e é um torcedor fanático do Palmeiras.