O plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou, por unanimidade, a abertura de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra o desembargador Luís César de Paula Espíndola, do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR). Também foi mantido seu afastamento do cargo, mas com o recebimento de salários.
Atuando na corte desde 1989, o magistrado virou notícia em julho do ano passado quando, durante o julgamento da 12ª Câmara Cível sobre a manutenção de medida protetiva a uma adolescente de 12 anos, assediada por um professor, responsabilizou a vítima pelo crime sofrido e disse que os “homens é que estão sendo assediados pelas mulheres, hoje em dia. As mulheres estão andando com cachorrinhos, estão loucas atrás de homens”.
Na esteira da repercussão das declarações, ele foi afastado do cargo pelo então corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão. Mais de um ano depois, a Reclamação Disciplinar contra ele chegou ao plenário do conselho.
No julgamento desta terça-feira (14), o atual corregedor nacional de Justiça, ministro Mauro Campbell Marques, trouxe depoimentos de vítimas de assédio moral e importunação sexual coletados durante a inspeção da Corregedoria no TJ-PR. Os relatos foram complementados pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Paraná (OAB-PR), Luiz Fernando Casagrande Pereira.
“O que o magistrado vinha adotando era seu próprio protocolo, não com perspectiva de gênero, mas com perspectiva de assediador e de importunador”, disse. “Falhamos nós, do sistema de justiça. Esse caso deve também construir um parâmetro de atuação para o acolhimento dessas vítimas”, completou.
Pereira ainda relatou o uso irregular de funcionárias do gabinete como empregadas domésticas e cuidadoras da mãe do desembargador. Também afirmou que as servidoras seguiam “protocolos de sobrevivência” para lidar com Espíndola, como o de não ficarem sozinhas com ele em nenhum momento.
Além do comportamento na sessão que culminou com seu afastamento, também foi trazido à tona no julgamento no CNJ a condenação de Espíndola pela prática de violência doméstica contra a irmã, também desembargadora do TJ-PR. O caso tramitou no Superior Tribunal de Justiça (STJ), com início em 2014 e última movimentação (embargos de declaração) em 2023.
O corregedor Mauro Campbell defendeu a necessidade da manutenção do afastamento do desembargador do cargo, não apenas para reparar os danos causados, mas também para prevenir mais condutas criminosas.
O ministro ainda destacou que o histórico de Espíndola e a falta de responsabilização adequada, como a prescrição de casos anteriores, é uma falha sistêmica que deve ser enfrentada de forma contundente. “O fato de que houve condenações por crimes de lesão corporal contra familiares apenas reforça a urgência de se abordar as questões comportamentais desse magistrado. (…) A prevenção de novas vitimizações deve ser uma prioridade”, disse.
“Salta aos nossos olhos o tempo que esses atos ilícitos foram praticados. Esse caso evidencia a importância da criação de comitês de assédios eficientes e eficazes, e que sejam fiscalizados pelo CNJ”, disse Renata Gil, presidente do Comitê de Combate ao Assédio do CNJ e também chefe da Ouvidoria Nacional de Justiça.
Afastado, mas recebendo salário
Durante o julgamento, o presidente da OAB-PR, Luiz Fernando Casagrande Pereira, comentou o fato de o desembargador estar afastado do cargo e seguir recebendo salários. “Muitos poderão dizer que é caro ter o desembargador Espíndola afastado com vencimentos. Mas caro mesmo é tê-lo julgando no TJ-PR”, disse ele.
Um levantamento feito por O Luzeiro nas folhas de pagamento disponíveis no site do Tribunal de Justiça mostra que Luís César de Paula Espíndola recebeu, ao menos, R$ 864.834,47 líquidos desde o mês de setembro de 2024. Duas folhas de pagamento não estavam disponíveis para consulta no Portal da Transparência da corte paranaense, as de setembro deste ano e a de novembro do ano passado.
Outro lado
O Luzeiro não conseguiu apurar qual o advogado constituído pelo desembargador no processo. O espaço está aberto para a manifestação do contraditório sobre o processo que tramita no CNJ.