Segundo a pesquisa The State of AI in Early 2024, da McKinsey, a adoção de inteligência artificial (IA) subiu de 55% para 72% globalmente em apenas um ano. Por outro lado, o relatório Gen AI’s Next Inflection Point: From Employee Experimentation to Organizational Transformation, de julho de 2024, mostra que, embora 91% dos profissionais afirmem utilizar IA no trabalho, somente 13% das empresas de fato implementaram algo na área que gerou algum resultado concreto.
A própria McKinsey aponta que mais da metade dos diretores de empresas que adotaram IA descrevem as suas iniciativas como “ainda em experimentação”, movidas mais pela onda do momento, para não ficar para trás, do que por uma estratégia planejada. Em outras palavras, muitas empresas ainda estão engatinhando no assunto, sem saber exatamente como transformar essa tecnologia em valor real.
Mas por que isso acontece?
Para entender melhor, vale olhar o ciclo de vida de qualquer tecnologia: ela nasce, é validada, adotada, passando a resolver problemas reais. Sobrevive aquela que encontra um uso prático, eficiente e sustentável. Quando deixa de resolver bem um problema, é substituída por outra mais viável, e depois isso acontece através de um processo de inovação, assunto da próxima coluna.
Vamos a um exemplo. O Raio-X.
Descoberto acidentalmente por Wilhelm Röntgen em 1895, era uma tecnologia muito cara, complexa de ser utilizada e restrita a poucos laboratórios. Com o tempo, ela foi miniaturizada, digitalizada e integrada a equipamentos simples. Hoje o Raio-X está presente em qualquer hospital, clínica e até em unidades móveis, podendo ser operado por técnicos comuns. O que era ciência avançada virou ferramenta cotidiana.
O segredo está na simplicidade.
A IA não precisa estar limitada a grandes projetos, especialistas ou gurus. Quando incorporada às ferramentas que já utilizamos no nosso dia a dia, ela se torna útil, intuitiva e acessível. Ajuda a automatizar tarefas, resolver problemas e liberar tempo para o que realmente exige o olhar humano.
No ambiente corporativo, já vemos a IA com usos viáveis em sistemas de atendimento, plataformas de RH, CRM, BI e diversas outras aplicações objetivas. No cotidiano das pessoas, a IA está embarcada em nossos celulares, streamings, assistentes digitais, GPS, carros e até nas recomendações que recebemos sem perceber. Tudo isso foi incorporado quase que naturalmente, sem fricção.
Assim como o Raio-X, a inteligência artificial está passando por esse mesmo processo de simplificação. Ela já deixou de ser um tema técnico complexo, restrito a laboratórios e entusiastas, e começa a aparecer embutida em aplicativos, sistemas de gestão, educação e saúde, de forma natural, validada e, principalmente, propondo uma utilização muito simples.
O ponto de virada de fato vai ocorrer quando a nova tecnologia adotada se tornar invisível e as pessoas passarem a usá-la sem precisar entendê-la profundamente. Estamos próximos desse momento.
O impacto positivo disso é enorme. Mais eficiência em diversas áreas da vida, aprendizado personalizado, menos desperdício, maior produtividade e mais tempo para criar e inovar. A IA não substitui a inteligência humana. Ela veio para ampliar as capacidades das pessoas.
As pesquisas confirmam esse potencial. Um estudo global da KPMG de 2025, em parceria com a University of Melbourne, que ouviu mais de 48 mil pessoas em 47 países, mostra que a maioria enxerga a IA como uma força transformadora, capaz de melhorar vidas e impulsionar indústrias. Por outro lado, a Gartner prevê que, até o fim de 2025, pelo menos 30% dos projetos de IA serão abandonados após a fase de prova de conceito. Mais um sinal de que o desafio não está em criar, mas em aplicar bem.
Assim como o Raio-X revolucionou a medicina e diversas outras áreas quando se tornou simples de usar, a inteligência artificial vai transformar a sociedade quando for adotada de forma ampla e natural.
A questão central não é ter pessoas supercapacitadas, mas garantir que todas as pessoas tenham acesso fácil a soluções que gerem benefícios reais, de forma prática e com pouca fricção.
A provocação é simples: precisamos conceituar menos, aplicar mais e simplificar muito. O verdadeiro poder dos pesquisadores IA deve estar concentrado em empacotar uma tecnologia complexa e poderosa, em soluções que facilitem a vida de verdade, como o Raio-X fez há mais de um século.
Quando isso acontecer, deixaremos de nos sentir como dinossauros para voarmos como drones.
José Manuel Barbosa é estrategista de gestão, governança e marketing, com ampla atuação como conselheiro, executivo em posições de C-level e empreendedor. www.linkedin.com/in/jmcbarbosa


