O mundo, o Brasil e o Paraná estão envelhecendo rápido. Isso não é só tema de saúde — é agenda de desenvolvimento, trabalho, mobilidade e desenho urbano.
E por que falar de “age-friendly” agora?
O Censo 2022 mostrou uma virada demográfica: já são 32,1 milhões de pessoas com 60+ no País (15,6% da população) e 22,17 milhões com 65+ (10,9%). Projeções do IBGE indicam que, em 2070, 37,8% da população brasileira será 60+, com idade média próxima de 48,4 anos — um salto que exige cidades planejadas para viver, trabalhar e circular bem aos 60, 70, 80+.
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No Paraná já temos cerca de 1,9 milhão de pessoas 60+ , quase o dobro de 22 anos atrás. Isso deveria colocar o tema no centro da estratégia urbana e econômica paranaense.
Blue Zones: o que inspirar (e o que filtrar) para políticas urbanas
As Blue Zones surgiram de estudos demográficos sobre áreas com concentração incomum de longevos (Sardenha/IT, Okinawa/JP, Nicoya/CR, Icária/GR). O conceito, associado a rotina ativa, dieta simples, conexões sociais e propósito, ganhou o mundo e virou referência de estilo de vida e desenho de comunidades.
Nos últimos anos, críticas questionaram a qualidade dos registros e o risco de vieses nos números de superidosos, pedindo cautela na “mitologia” em torno do fenômeno. Mas, mesmo assim, revisões acadêmicas e a própria equipe original reforçam que, com validações rigorosas, há lições úteis. Para as cidades, o ponto prático é: ambientes caminháveis, convivência de bairro, comida in natura acessível e participação social funcionam — independentemente do debate sobre recordes de idade.
Na visão urbanística, estamos falando de calçadas contínuas e sombreadas; travessias seguras com tempo ampliado; bancos e banheiros públicos; centros de convivência 60+ por bairro; moradia bem localizada (retrofit acessível); comércio e serviços essenciais a 15 minutos a pé.
O que é, afinal, uma cidade age-friendly?
Segundo a OMS/Opas, cidades e comunidades são amiga(s) da pessoa idosa a partir de 8 pilares:
- espaços abertos e edifícios;
- transporte;
- habitação;
- participação social;
- respeito e inclusão;
- participação cívica e emprego;
- comunicação e informação;
- apoio comunitário e saúde.
É a base usada no mundo inteiro para diagnóstico e certificação. E para pensar em uma cidade inteligente e amiga da turma dos 60+ (eu e você daqui a pouco) um bom caminho é combinar os 8 domínios da OMS com indicadores de cidades inteligentes (ISO 37122) para medir caminhabilidade, acessibilidade, segurança viária, inclusão digital e qualidade do transporte — com participação direta de pessoas idosas no desenho das soluções.
Paraná em posição de liderança
Em maio de 2025, o Paraná tornou-se o primeiro Estado brasileiro (e o 1º da América do Sul) a integrar a Rede Global de Cidades e Comunidades Amigas das Pessoas Idosas da OMS como membro afiliado — um guarda-chuva institucional que acelera certificações e políticas municipais. Hoje, o Estado concentra a maior parte das cidades brasileiras certificadas.
Trabalho, renda e reskilling 60+: um ativo econômico
Populações envelhecidas pressionam a oferta de trabalho — mas também abrem espaço para políticas de requalificação, arranjos flexíveis e combate ao etarismo. O Employment Outlook 2025, da OCDE, aponta que ampliar aprendizagem ao longo da vida, mobilidade ocupacional e práticas de contratação inclusivas sustenta produtividade e crescimento em contextos de envelhecimento. Para cidades, isso se traduz em hubs de capacitação 60+, programas de “segunda carreira” e balcões de emprego sênior.
“Checklist 90 dias” para prefeitos(as) e secretarias
1) Diagnóstico: aplicar o questionário OMS (8 domínios) com participação direta de pessoas idosas; mapear dados 60+ por bairro e principais rotas (UBS, CRAS, terminais, feiras);
2) Obras rápidas: corrigir calçadas críticas; instalar bancos e sombreamento a cada 200–300 metros; ampliar tempo semafórico em travessias com maior fluxo 60+; garantir banheiros públicos em praças-âncora;
3) Mobilidade de bairro: piloto de micro-ônibus sob demanda para ligações curtas; paradas acessíveis; informação clara e em múltiplos formatos;
4) Saúde conectada: teleorientação nas Unidades Básicas de Saúde, visitas programadas e hubs 60+ nos bairros;
5) Emprego sênior: balcão 60+ com vagas flexíveis, trilhas de letramento digital e parcerias com empresas locais para “segunda carreira”.
O termo age-friendly é mais do que um rótulo. É uma estratégia de cidade inteligente centrada nas pessoas: planejar espaços, serviços e trabalho para que a população 60+ viva bem e siga produtiva — o que, por tabela, melhora a cidade para todo mundo. O Paraná já abriu a porta institucional. Agora é a hora do chão de fábrica urbano: calçada, travessia, ônibus, inclusão digital e emprego sênior.
Planejar para o 60+ é investir na cidade inteira — o futuro de todos começa agora.
Gustavo Comeli é palestrante e consultor com mais de 20 anos de experiência atuando com estratégia, liderança e inovação. www.linkedin.com/in/luiz-gustavo-comeli/