O vereador Professor Euler (MDB) recomendou ao Conselho de Ética da Câmara de Curitiba nesta quarta-feira (17) a cassação da vereadora Maria Letícia (PV) por abuso de autoridade. A parlamentar causou um acidente de trânsito, sem vítimas, no bairro Bigorrilho em novembro do ano passado. A recomendação do relatório de Euler deveria ser votada no colegiado na sequência, mas foi interrompida por um pedido de vista do vereador Angelo Vanhoni (PT), que anunciou que fará um relatório alternativo, com pena diferente da cassação.
O presidente do Conselho de Ética, vereador Dalton Borba (PDT), então deu prazo para que o texto seja apresentado na próxima segunda-feira (23). Na mesma data, os vereadores escolherão entre os dois relatórios. Apenas penas de cassação ou suspensão de mandato são levadas ao plenário. As demais são decididas dentro do Conselho de Ética.
A conduta de Maria Letícia foi incluída em um Processo Ético-Disciplinar (PED 01/2024). O relator analisou separadamente os fatos supostamente ocorridos no dia 25 de novembro – direção sob efeito de substância, tentativa de evadir-se do local e desacato à autoridade policial. Euler opinou pela improcedência e pelo arquivamento dos dois primeiros atos, entretanto entendeu que existiu abuso de autoridade.
Com o pedido de vista de Vanhoni, o caso, que tem prazo máximo para ser concluído, fica cada vez mais perto da prescrição, ou seja, seria extinto sem punição. Foi o que aconteceu com o PED que levou à cassação do ex-vereador e hoje deputado estadual Renato Freitas (PT), que foi aprovada tanto no Conselho de Ética quanto pela maioria da Casa. A decisão posteriormente foi revertida pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), por ultrapassar o prazo de 90 dias contido num decreto-lei federal de 1967. A Câmara, na ocasião, seguiu seu regimento interno, que estabelece um prazo diferente.
Pelo prazo máximo da legislação federal, o processo contra Maria Letícia deve ser concluído até o dia 6 de maio.
“Eu sou vereadora, vocês vão se ferrar”
A frase proferida pela vereadora, segundo o Boletim de Ocorrência, foi determinante para a decisão de Professor Euler, que tipificou a infração ético-disciplinar no art. 10, inciso I do Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Municipal de Curitiba, cuja punição pode ser a perda do mandato.
“Constatou-se simultaneamente abuso de autoridade, visto que a parlamentar não apenas ofendeu os policiais, mas também invocou a sua condição de vereadora para tentar coagi-los a não cumprirem o dever deles. Quando a vereadora fala ‘eu sou vereadora, e vocês vão se ferrar’, ela sai da sua vida simplesmente privada e traz o seu mandato diretamente para dentro da cena do acidente”, diz um trecho do parecer de Euler.
Ele ainda faz uma ponderação. “Se ela tivesse dito somente ‘vocês vão se ferrar’, obviamente já seria algo reprovável, mas não haveria possibilidade de ser enquadrado como quebra de decoro parlamentar. No entanto, da forma como ela se dirigiu aos policiais, querendo com seu cargo inibir a ação deles, a representada abusou explicitamente das prerrogativas asseguradas aos vereadores”, concluiu.
E foi o fato de ela não estar no exercício efetivo do mandato no momento do acidente que as outras duas supostas condutas foram avaliadas pelo relator como improcedentes. Em ambos os casos, Euler aponta “o inegável alto grau de reprobabilidade da conduta de dirigir embriagada, apesar do senso comum de que este comportamento por si só já seria suficiente para cassação de mandato” de Maria Letícia.
Entenda o caso
Segundo a Câmara Municipal de Curitiba, dois dias depois do acidente, o presidente da Casa, Marcelo Fachinello (Pode), determinou à Corregedoria que abrisse uma sindicância para apurar a autoria e a materialidade dos acontecimentos imputados à parlamentar. No dia 15 de janeiro, o corregedor Ezequias Barros (PMB) confirmou o envolvimento da parlamentar na colisão e opinou que haveriam indícios de ofensa ao Código de Ética, sem no entanto entender que seriam passíveis de cassação de mandato.
Nas alegações finais, apresentadas à Câmarano dia 2 de abril, a defesa da vereadora Maria Leticia rebateu as três hipóteses de quebra de decoro em discussão no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, pedindo o arquivamento da representação.
“No presente caso, não é crível que se depreenda a mínima existência de quebra de decoro parlamentar, pois a conduta praticada pela representada, ainda que se possa considerar imprudente, não representou ofensa à reputação do Poder Legislativo”, diz o documento, que tem 38 páginas e é assinado pelos advogados Guilherme de Salles Gonçalves e Fernanda Bernardelli Marques.